Numa das últimas manifestações de Jesus aos discípulos após sua ressurreição, estando junto ao mar de Tiberíades, por três vezes ele perguntou a Pedro: “Simão, filho de João, amas-me mais do que estes outros?” A cada resposta afirmativa de Pedro, Jesus lhe disse: “Pastoreia as minhas ovelhas” (João 21.15-17). O ministério de pastorear as ovelhas do Senhor estende-se através dos séculos e nos atinge. Cada discípulo que cuida de vidas que nasceram de novo e estão realmente comprometidas com Jesus recebe esse encargo. Notemos que a incumbência dada a Pedro é precedida pela pergunta: “Amas-me?”. Jesus condiciona entregar o pastoreio de vidas à pessoa que realmente o ama.
Cremos, firmemente, que a Bíblia é divinamente inspirada e que suas palavras foram cuidadosamente escolhidas pelo Espírito de Deus. Entre os significativos vocábulos selecionados pelo Espírito Santo, encontramos os termos “pastor” e “ovelhas”. Na Bíblia, muitas vezes deparamo-nos com a palavra “pastor” designando pessoas que cuidam de vidas; em especial os profetas do Antigo Testamento assim as qualificam. E, algumas vezes, o povo de Deus é citado como “ovelhas” do rebanho de Deus. Baseado nisso, posso me dirigir a vocês como ovelhas do Grande Pastor e, ao mesmo tempo, como pastores, pois estão comissionados para apascentarem as ovelhas do Senhor Jesus.
Todos nós que reunimos, em nossas casas, vidas que estão sob o senhorio do Senhor Jesus e as acolhemos, precisamos reconhecer a grande responsabilidade que temos. E, ao mesmo tempo, devemos nos alegrar pelo privilégio que nos é concedido de colaborarmos com o Reino sempiterno, formando vidas que alcançarão o propósito ao qual Deus as desafia: serem “santos e irrepreensíveis perante ele” (Efésios 1.4). Entretanto, saibamos que ser pastor não é um título; é a designação de um serviço que nos foi entregue e pelo qual responderemos diante do Senhor. Alegremo-nos, pois, porque trabalhamos para aquele que tem um nome que está acima de todo nome e ele nos chamou, individualmente, dizendo-nos que, no serviço que lhe prestamos, o Pai é glorificado (João 15.8).
Ser um Pastor
A palavra “pastor”, como vimos, tem uma forte conotação bíblica. Desde cedo entre os hebreus, povo eminentemente pastoril, esse termo tornou-se clássico para expressar, também, o cuidado e a providência divina. O texto áureo que mais demonstra isso, mui certamente, é o Salmo 23 que, numa linguagem bucólica, indica a pessoa de Deus como “o meu pastor”, enquanto que o autor do salmo coloca-se na posição de sua ovelha. Encontramos, nessa preciosa figura, o zelo que um discipulador deve ter no trato com os seus discípulos. Na pessoa do bom pastor, que o salmo apresenta, divisamos as varias incumbências que um discipulador deve realizar: conduzir, alimentar, refrigerar a alma, guiar, acompanhar e servir a ovelha, num cuidado onde a bondade e a misericórdia se expressam de forma permanente. Lembremos sempre que um discipulador cristão, no exercício de tal função, representa a pessoa do Senhor Jesus. Certamente, jamais nos igualaremos a ele nesse mister, mas devemos seguir o exemplo que nos legou.
Jesus atribuiu a si próprio a figura e a função de pastor. E, assim como as utilizou ilustrando seu ensino, ele as aplicou, também, aos discípulos. O vocábulo tornou-se presente na igreja apostólica, tanto que Paulo o incluiu na lista dos serviços que Jesus concedeu aos santos – “E ele mesmo [Jesus] concedeu uns para apóstolos, outros para profetas, outros para evangelistas e outros para pastores e mestres” (Efésios 4.11).
O Espírito Santo escolheu, com especial cuidado, também, a palavra “diaconia” e a associou ao trabalho do pastor. Diaconia indica, na sua origem, o serviço prestado pelos escravos, pessoas que a sociedade humana considera inferior. Um dos serviços do escravo era servir a mesa de seu senhor, abastecendo-a com o alimento e o vinho. Imaginemo-nos realizando tal trabalho!
Mas como “Deus escolheu as coisas loucas do mundo para envergonhar os sábios e escolheu as coisas fracas do mundo para envergonhar as fortes” (1 Coríntios 1.27), o Espírito Santo separou a palavra “diaconia” – trabalho escravo – para designar o serviço cristão. O paradoxo, aqui, é que uma sublime atividade espiritual está nas mãos de escravos! O Espírito Santo sabe muito bem sabe que precisamos ser, em primeiro lugar, servos do Senhor Jesus Cristo para, então, poder servi-lo. Se ele não for o nosso Senhor, não nos será dado nenhum serviço em seu Reino. Ficaremos, calculo, expostos no mercado de escravos, esperando alguém que nos adquira para seu serviço.
É inerente em nós, por natureza, querer títulos, altas posições, ser o primeiro, ser o maior, ser considerado e reconhecido naquilo que fazemos. Não foi justamente isso que levou os discípulos a discutirem entre si, para saberem qual deles era o maior? Eles buscavam prestígio. Jesus precisou exortá-los: “Se alguém quer ser o primeiro, será o último e servo de todos” (Marcos 9.35). O prestígio bíblico está em servir e não em ser o primeiro. Aquele que é um genuíno servo de Jesus sabe que sua vida precisa ser a extensão da vida daquele que disse: “Pois qual é o maior: quem está à mesa ou quem serve? Porventura, não é quem está à mesa? Pois, no meio de vós, eu sou como quem serve” (Lucas 22.27). Nunca esqueçamos que herdamos da queda de Adão o desejo que estava no coração de Lúcifer, o diabo: de ocupar a posição mais alta. Mas no trato dos valores do Reino de Deus, nosso desejo deve ser um só: servir.
Na última ceia de Jesus com os discípulos, cumprindo uma ordem do Mestre, eles arrumaram o local onde comeriam a Páscoa. Puseram uma toalha na mesa. Sobre ela os cálices para o vinho, as bandejas para o pão e, também, ao lado, uma bacia, uma talha com água e uma toalha. Sentaram-se à mesa e todos se sentiram importantes demais para pensar que um deles deveria lavar os pés dos demais, segundo o costume da época. Esqueceram que deveriam ser servos e, o mais grave, não lembraram o ensino já recebido do Senhor. É sempre difícil descer do pedestal em que nos colocamos. Assim, nenhum deles dispôs-se a assumir a função de servo de seus irmãos.
Jesus, após assentar-se à mesa com os discípulos, vendo que ninguém tomava a iniciativa de realizar o ato tão necessário, tranqüilamente, levantou-se, pegou a bacia, a jarra com água, a toalha, e começou a lavar e enxugar os pés daqueles homens. Após, o Mestre lhes ensinou: “Vós me chamais o Mestre e o Senhor e dizeis bem; porque eu o sou. Ora, se eu, sendo o Senhor e o Mestre, vos lavei os pés, também vós deveis lavar os pés uns dos outros. Porque eu vos dei o exemplo, para que, como eu vos fiz, façais vós também” (João 13.13-15).
Se um pastor discipulador não tem o espírito de serviço àquele de quem cuida falta-lhe a mais necessária qualificação para o que se propôs fazer. Usando uma parábola, Jesus ensinou: “Qual de vós, tendo um servo ocupado na lavoura ou em guardar o gado, lhe dirá quando ele voltar do campo: Vem já e põe-te à mesa? E que, antes, não lhe diga: Prepara-me a ceia, cinge-te e serve-me, enquanto eu como e bebo; depois, comerás tu e beberás? Porventura, terá de agradecer ao servo porque este fez o que lhe havia ordenado? Assim também vós, depois de haverdes feito quanto vos foi ordenado, dizei: Somos servos inúteis, porque fizemos apenas o que devíamos fazer” (Lucas 17.7-10). Nessa palavra, Jesus comunica duas grandes verdades. Primeiro, o amo possui toda a autoridade sobre o servo, tal como Jesus a tem sobre nós – a vontade do amo deve ser assumida pelo escravo. Segundo, a única atitude do servo é de humildade e submissão. Jesus mostra que o amo não é devedor ao servo pelo seu trabalho, pelas tarefas que este executa.
A parábola mostra que, quando trabalhamos para Deus, ele nada nos deve, nem está obrigado a satisfazer nossos desejos. A atitude apropriada que devemos ter é a de considerarmo-nos sem merecimento de qualquer recompensa. O discípulo que trabalha diligentemente para o Senhor tem a tentação de pensar que deveria ter uma vida mais fácil e melhor, porque fez seu trabalho adequadamente. Para nós resta, realmente, uma única posição: considerarmo-nos servos inúteis. O texto trata, ainda, com o orgulho que quer se expressar quando fazemos, mesmo de forma correta, serviços que nos parecem úteis ao Senhor, mas que ele não nos pediu. Tais esforços nada significam para ele. Ele é o Senhor e nós, como servos, temos que fazer o que ele pede. Não podemos esquecer que servimos àquele que deu a sua vida por nós e que todo o trabalho que lhe fazemos deve resultar da obediência a ele e da gratidão pelo que ele fez.
0 texto que narra a visita de Jesus ao lar de Marta e Maria (Lucas 10.38-42) reforça o ensino de que todo o trabalho que fazemos para o Senhor sem que ele nos tenha designado fazer será um serviço que não terá a sua apreciação. Imaginemos o quadro: Marta sentada junto com Maria ouvindo a Jesus, sem ninguém estar na cozinha. Em um dado momento, Jesus volta-se para Marta e lhe diz: “Marta, tu podes preparar um lanche para nós?” Isso faria o trabalho de Marta mais legítimo. O problema está quando o servo determina o que deve fazer sem buscar saber qual é o serviço que o seu senhor requer dele. Eis aqui um princípio inconteste: Todo o nosso serviço, como servos do Senhor Jesus, deve ser designado por ele, caso contrário, não será serviço para ele. Jesus não admite intrometidos no seu trabalho!
Em Atos dos Apóstolos encontramos os doze convocando a comunidade de Jerusalém e lhes dizendo: “Não é razoável que nós abandonemos a palavra de Deus para servir às mesas” (Atos 6.2). Uma tradução mais fiel ao texto original seria: “Não é razoável que nós abandonemos o serviço da palavra de Deus para servir às mesas”. No texto original, encontramos o mesmo verbo tanto para o ato de servir à Palavra como servir às mesas. Ambos os serviços visavam alimentar, um com a palavra e a oração, e o outro com o pão material. Isso atesta que no corpo de Cristo há diferentes formas de servir. Efésios 4.11 enumera diferentes serviços que visam ao aperfeiçoamento dos santos: apóstolos, profetas, evangelista, pastores e mestres. Todos são escravos do Senhor, servindo a sua mesa. Mas compete ao Espírito Santo indicar a cada um desses homens como vão servir e a que mesa servirão. O importante é que os servos estejam atentos, servindo às mesas sob a liderança do Senhor.
Lembremos a exortação de Pedro: “Servi uns aos outros, cada um conforme o dom que recebeu, como bons despenseiros da multiforme graça de Deus” (1 Pedro 4.10). Precisamos servir, mas com a capacitação que vem do Senhor – o dom. Essa é a chave para o bom desempenho do que fazemos. “Mas um só e o mesmo Espírito realiza todas estas cousas, distribuindo-as, como lhe apraz, a cada um, individualmente” (1 Coríntios 12.11).
Nesse texto há três verbos que precisamos notar: ele realiza, ele distribui, ele se apraz. Há um plano divino ao qual devemos nos ajustar, sem nenhuma tentativa de manipular a Deus ou aos demais membros do corpo. Os dons de serviço para ministrar aos outros provêm do Espírito de Deus, não podem ser produzidos por intervenções ou pressões humanas. Quando o Espírito decide dar um dom, ele sabe a quem o concederá, o momento adequado, e como o dom deve ser empregado. Assim, é bom pensar que, se o Senhor ainda não nos capacitou para sermos pastores discipuladores, é melhor ser uma boa ovelha sob cuidado de um pastor do que ser um pastor não capacitado. A essa pessoa é aconselhável esperar o tempo do Senhor.
Quem são os Pastores Discipuladores?
Quem pode ser um autêntico pastor no rebanho de Deus? Tomo como resposta uma frase de Derek Prince: “São aqueles que têm Cristo vivendo dentro deles” – Anotações que fiz de uma conferência na Morris Cerullo School of Ministry, San Diego, Califórnia, USA – 1979.
Essa deve ser a máxima característica de quem cuida de ovelhas do rebanho do Senhor. Se Cristo não estiver vivendo em nós, como poderemos fazer o seu serviço? O autêntico servo é aquele que foi adquirido pelo seu Senhor e sabe muito bem o que lhe é requerido. Tal obreiro precisa ter requisitos básicos, como: ter nascido de novo, estar inteiramente comprometido com o Senhor, submeter-se totalmente ao seu senhorio, crer em sua palavra, ser obediente às suas instruções e determinações, e estar sempre cheio do Espírito Santo, deixando-se guiar por ele.
Nunca esqueçamos que, primeiro, Deus precisa operar em nós para que ele possa, então, operar através de nós. Antes de fazermos o trabalho de Deus, precisamos ser trabalhados por ele. Sempre teremos problemas quando corremos para fazer a obra antes que o Senhor nos prepare para ela. Jesus ensinou que para edificar uma casa que não se abale quando a tempestade se arroja sobre ela, é preciso, primeiro, pôr os seus fundamentos sobre a rocha (Mateus 7.24-27). Antes de Jesus ordenar aos seus discípulos “ide, portanto, fazei…” (Mateus 28.19), ele disse: “vinde após mim e eu vos farei…” (Mateus 4.19). O pregador Charles H. Spurgeon disse, certa vez, aos pastores que o ouviam: “Vão ao campo, trabalhem até não aguentar mais, matem-se de tanto trabalhar e depois orem para poder ressuscitar outra vez”.
Há um forte apelo no texto de Hebreus 12.2: “olhando firmemente para o Autor e Consumador da fé, Jesus, o qual, […] está assentado à destra do trono de Deus”. Por que olhar para Jesus? Porque ele quer formar a sua imagem – seu caráter – em nós, visando que o nosso trabalho para ele seja à semelhança do trabalho que os homens que formou fizeram. É possível alguém fazer a obra do Senhor com recursos, forças e capacitação próprios. Mas a Bíblia atesta que isso é como construir algo com madeira, feno e palha – elementos perecíveis – e não com ouro, prata e pedras preciosas – substâncias imperecíveis (1 Coríntios 3.12).
A presença do amor no pastoreio de discípulos
Vimos que naquele encontro que Jesus teve com Pedro, após a sua ressurreição, ele lhe perguntou por três vezes: “Amas-me?” (João 21.15-17). Jesus o sabatinava no final do curso de discipulado de três anos. Aprovado no amor pelo seu Senhor, Pedro recebeu uma incisiva comissão: “Apascenta os meus cordeiros” (v 15); “Pastoreia as minhas ovelhas” (v 16); “apascenta as minhas ovelhas” (v 17).
Sem real amor por Jesus, ninguém pode apascentar legitimamente o rebanho do Senhor. Por que Jesus perguntou três vezes a Pedro se ele o amava? O número três na Bíblia sugere integridade, perfeição, plenitude. São essas qualidades de amor que Jesus quer encontrar naqueles que chama para colaborarem com ele, pois quer que os que estão sob cuidado e orientação recebam a mesma qualidade de amor que dedicamos a ele. Ele quer que o amemos – a ele e aos que estão sob o nosso cuidado – com amor íntegro, perfeito e pleno.
Um estudioso da Palavra comenta ser interessante o fato de que no diálogo de Jesus com Pedro não é usada a mesma palavra “amor”. Segundo o texto grego, Jesus usou a palavra “agapau” e Pedro usou “fileo”. A primeira palavra denota o amor mais elevado que provém da fonte divina, enquanto a segunda refere-se ao amor natural da afeição pessoal. É o amor “agapau” que Jesus pede a Pedro e quer receber de nós. É com essa qualidade de amor que devemos amar os que estão sob nosso cuidado pastoral.
Aprovado, embora com nota incompleta, Pedro, que já havia recebido o anzol de pescador de homens, agora recebe o cajado de pastor! Mais tarde, idoso, Pedro irá dizer aos seus discípulos: “pastoreai o rebanho de Deus que há entre vós, não por constrangimento, mas espontaneamente, como Deus quer; nem por sórdida ganância, mas de boa vontade;nem como dominadores dos que vos foram confiados, antes, tornando-vos modelos do rebanho” (1 Pedro 5.2). É essa determinação que o presbitério local está atualizando a cada um de vocês. Façamos isso com todo o amor que provém do Senhor Jesus.
Para tanto, precisamos cultivar um relacionamento de primeira mão com Jesus. Somente isso dará sentido e firmeza ao nosso trabalho de pastor e discipulador. Nossa persistente comunhão, nossa firme convicção, nossa inabalável fé no Senhor, resultantes de uma experiência pessoal com ele, é que nos habilitarão a produzir discípulos que permaneçam irredutíveis na vida cristã. Falamos muito em estarmos unidos através de “juntas e ligamentos”, isso é certo e devemos promovê-lo. Mas não alcançaremos uma firme vinculação se os membros do corpo não tiverem o mais importante vínculo: a comunhão pessoal, íntima com aquele que é a cabeça do corpo.
Todo aquele que foi investido do trabalho de cuidar de vidas que pertencem ao rebanho do Senhor Jesus deve apresentar as mesmas qualidades do Bom Pastor. Para isso, vejamos João10, onde Jesus mostra o pastor que ele é.
- “Conheço as minhas ovelhas e elas me conhecem a mim” (v 14). Há, aqui, a mutualidade de conhecimento – conheço e sou conhecido. Um pastor precisa conhecer as ovelhas que estão sob seu cuidado. As ovelhas precisam conhecer aquele que as cuida. O conhecimento vem da comunhão, do estar junto, do participar da vida do outro. Quando há esse companheirismo, o pastor conhece bem as suas ovelhas, então, realmente, “ele chama pelo nome as suas próprias ovelhas” (v 3), “e elas o seguem, porque lhe reconhecem a voz” (v 4). Ele poderá guiá-las, orientá-las, instruí-las, para que possam, em sua maturidade, cuidar de outras ovelhas.
- ”Ele as conduz” (v 3); “vai adiante delas, e elas o seguem” (v 4); “a mim me convém conduzi-las” (v 16). O pastor é quem vai adiante, direciona o rebanho, pois conhece muito bem o caminho em que devem seguir e onde ele os levará. O pastor é o exemplo para o rebanho. Ele o leva ao campo da Palavra e com ela o alimenta. O faz beber da fonte de água pura e conhece perfeitamente sua responsabilidade em fazê-lo. O pastor discipulador sabe que sua máxima obrigação é conduzir as ovelhas aos pés do Senhor Jesus para que o conheçam mais e mais.
- “O bom pastor dá a vida pelas ovelhas” (v 11,15). Por duas vezes, nesse texto, Jesus afirma o que realmente veio fazer – dar sua vida. E ele o fez para proteger seu rebanho do ladrão e da perdição eterna. Quem trabalha com vidas e as ama, sentindo-se responsável por elas, vai esforçar-se para que elas não percam a salvação que já alcançaram. Precisa estar pronto a dar-se inteiramente, defendendo-as do diabo, dos falsos profetas, dos enganadores que trazem heresias, da corrupção moral tão evidentes nesses dias do fim. Muitos homens de Deus, ao longo da história da Igreja, deram, literalmente, as suas vidas para defenderem a fé que transmitiam ao rebanho que estava sob seus cuidados.
Lembro-me de um homem, companheiro de meu pai no ministério que receberam do Senhor. Chamava-se Cassiano Monteiro. Juntos eles saíam a cavalo, única condução que lhes era possível ter naqueles dias de pioneirismo, em viagens que se prolongavam, às vezes, por mais de um mês, permanecendo longe de suas sedes e das suas famílias. Visitavam o rebanho espalhado por muitos municípios-colônias do Rio Grande do Sul. Em uma das viagens, Cassiano ficou enfermo. Necessitando voltar e buscar recursos para reaver sua saúde, não o fez, premido pelo imperativo que lhe dominava: primeiro cumprir sua missão de dar assistência às famílias que aguardavam sua chegada. Era inverno extremamente frio e chuvoso. Ele foi acometido por uma tuberculose galopante – assim era designada, na época, a doença – vindo a falecer. Ainda jovem, ele literalmente deu sua vida pelas ovelhas do rebanho do Senhor.
O Apóstolo exorta: “Ora, tendo Cristo sofrido na carne, armai-vos também vós do mesmo pensamento […] para que, no tempo que vos resta na carne […] vivais […] segundo a vontade de Deus” (1 Pedro 4.1,2). Estejamos dispostos a nos sacrificar por aqueles que cuidamos, para que vivam na abundante vida espiritual. Saibamos que é para o Senhor que fazemos o trabalho. “Tudo quanto fizerdes, fazei-o de todo o coração, como para o Senhor e não para homens, cientes de que recebereis do Senhor a recompensa da herança. A Cristo, o Senhor, é que estais servindo” (Colossenses 3.23,24); “fazei tudo para a glória de Deus” (1 Coríntios 10.31).
Em Mateus 18.12,13, Jesus fala do bom pastor que vai atrás da ovelha que se extraviou, fazendo isso com grande empenho. É bom lembrar que foi apenas uma ovelha que se perdeu. Ela poderia ser achada ou não. Mas, o pastor, porque valoriza essa ovelha, deixa no monte as noventa e nove, indo buscar a que lhe faltava. Essa pequena parábola fala muito do amor que Jesus tem para com os que estão desviados do rebanho. O amor de Jesus é:
a) Amor individual – Noventa e nove não é um número suficiente para formar um rebanho? O bom pastor não descansa, pois a ovelha perdida é “uma”, não é um zero. Sua ausência deixará o rebanho incompleto. Ela não pode faltar. É justamente ela que precisa ser lembrada e socorrida.
b) Amor paciente – Com que carinho Jesus diz aos seus: “Não temas, ó pequenino rebanho” (Lucas 12.32). Mesmo sendo “pequenino rebanho”, tem toda a atenção do seu Pastor. Dele o rebanho pode esperar socorro, interesse e proteção. Como um rebanho necessita de um paciente pastor! Com esse amor, tratemos o rebanho que nos foi confiado.
c) Amor responsável – O bom pastor não acusa nenhuma de suas ovelhas por ter se desgarrado do rebanho: ele vai buscá-la. Cometa a ovelha uma infração, o pastor deve continuar a amá-la, sentindo-se responsável em ajudá-la, recuperando-a. O amor responsável não se irrita, não se exaspera, não se recente do mal, tudo sofre, tudo espera. Não foi o amor responsável de Deus que, um dia, nos buscou lá onde estávamos extraviados e nos acolheu meigamente?
A mensagem de Ezequiel 34
A profecia inicialmente traz uma pergunta: “Não apascentarão os pastores as ovelhas?” (v 2). Embora a palavra profética seja apresentada em termos negativos, assim mesmo podemos ver o que Deus espera daqueles a quem confiou as suas ovelhas.
“A fraca não fortalecestes” (v 4) – Sempre encontraremos membros fracos e indefesos no rebanho. Eles precisam ser atendidos de forma muito especial. Muitos precisam de uma U.T.I. – Unidade de Tratamento Intensivo – espiritual. Quando uma ovelha enfraquece, obviamente, precisa ser fortalecida, necessita de atenção e cuidado muito especiais. A missão do pastor é fortalece-la.
“A doente não curastes” (v 4) – Há doentes do espírito, da alma e do corpo; todos necessitam de atenção especial e de muito amor. Há um ministério especifico que precisa ser realizado para com cada enfermo. Todos necessitam de um irmão junto a eles. A oração do pastor deve ser, sempre, o principal remédio para o espírito atribulado, para a alma perturbada e para o corpo machucado. Não esqueçamos o que Tiago diz: “E a oração da fé salvará o enfermo, e o Senhor o levantará” (Tiago 5.15). Tive uma experiência que me falou muito. Fui visitar um enfermo no hospital. Ao chegar perto do seu leito, ele tomou minha mão e disse: “Eu sabia que o irmão viria ver-me”. Senti que esse irmão, em sua solidão e sofrimento, precisava de alguém ao seu lado, trazendo-lhe ânimo, fé e a solicitude de uma presença amiga. Fiquei pensando como esse irmão se sentiria abandonado se eu não o tivesse visitado.
“A quebrada não ligastes” (v 4) – É difícil ajudar alguém com sua alma quebrada, mas é preciso assisti-lo nessa necessidade. Não podemos ficar distantes desses, pois eles precisam da simpatia de seu pastor. Às vezes a solução é apenas ouvi-lo em sua mágoa, seu sofrimento, seu dissabor, e isso o ajudará muito. Se nós, que estamos bem perto do discípulo necessitado, não nos dispusermos a ajudá-lo, quem o fará?
“A desgarrada não tornastes a trazer” (v 4) – Se não guardarmos o rebanho, é fácil a ovelha se desencaminhar e se perder. Mas nem sempre o pastor nota o fato e, quando sente sua ausência, é tarde demais. Não podemos admitir que a ovelha se desgarre do redil e isso não seja notado. É hora de ir buscá-la, pois é presa fácil do sistema do mundo em que vivemos. O bom cajado sempre levará a ovelha desgarrada ao seu devido lugar, junto às demais.
“A perdida não buscastes” (v 4) – Jesus, de uma forma precisa declarou qual era a sua missão: “Porque o Filho do homem veio buscar e salvar o perdido” (Lucas 19.10). O pastor discipulador precisa imitar o seu Senhor. E quantos precisam ser assistidos por esse ministério de levar o perdido ao reencontro do caminho.
Diante do pastor faltoso é desafiante o que Deus diz que fará: “A perdida buscarei, a desgarrada tornarei a trazer, a quebrada ligarei e a enferma fortalecerei” (Ezequiel 34.16). Deus assumirá a tarefa que nos foi dada realizar. Quando não encontra ajudante, ele assumirá o trabalho sozinho, pois ele ama as suas ovelhas! Mas ele quer que sejamos colaboradores diretos nesse ofício de fortalecer, curar, ligar, buscar e trazer de volta. Ao negligente no trabalho, porém, resta uma repreensão: “Eis que eu estou contra os pastores e deles demandarei as minhas ovelhas; porei termo no seu pastoreio” (v 10).
Centenas de anos antes, o clamor que partiu do coração de Moisés quando Deus anunciou-lhe que o recolheria de entre o seu povo para estar com o povo celestial foi: “O Senhor, autor e conservador de toda vida, ponha um homem sobre esta congregação que saia adiante deles, e que entre adiante deles, e que os faça sair, e que os faça entrar, para que a congregação do Senhor não seja como ovelhas que não têm pastor” (Números 27.16,17).
Considerações
Três designativos são dados a Jesus nas Escrituras: O Bom Pastor (João 10.11), o Grande Pastor (Hebreus 13.20) e o Supremo Pastor (1 Pedro 5.4). Lembremos: nós servimos àquele que é o Bom, o Grande e o Supremo Pastor. Ele não exige que sejamos como ele é – Bons, Grandes e Supremos – ele nos pede que sejamos “bons” no trato com as vidas que lhe pertencem, que sejamos “grandes” no esforço de servi-las e “supremos” em confiarmos nele, co-participando da glória que há de ser revelada no seu grande dia.
Há um apelo que nos vem do Apóstolo: ”pastoreai o rebanho de Deus que há entre vós, não por constrangimento, mas espontaneamente, como Deus quer; nem por sórdida ganância, mas de boa vontade; nem como dominadores dos que vos foram confiados, antes, tornando-vos modelos do rebanho. Ora, logo que o Supremo Pastor se manifestar, recebereis a imarcescível coroa da glória” (1 Pedro 5.2-4). A grande tônica desses versículos não está em receber a coroa da glória que não murcha, mas sim em “tornando-vos modelos do rebanho”. Tornar-se modelo é uma necessidade imediata, receber a coroa e uma recompensa futura. O pequeno rebanho que abrigamos em nossas casas necessita ter um modelo vivo bem presente diante dele. Sejamos esse modelo vivo, a partir do modelo do Supremo Pastor, Jesus Cristo. Amém.
Palavra trazida aos discipuladores da igreja em Porto Alegre, no Segundo Módulo de Treinamento
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