Capítulo 8 – Caio se enfurece contra os judeus, porque eles não queriam, bem como os outros povos, reverenciá-lo como deus.
Penso ter demonstrado claramente como Caio não tinha relação alguma com os semideuses e menos ainda com os deuses. Jamais um príncipe teve mais mesquinhas e vergonhosas inclinações; ele aceitava cegamente e com ardor desmesurado tudo o que lhe vinha à mente; sua ambição tocava as raias da loucura, sua obstinação era invencível e seus desejos desregrados não tinham limites, nos abusos que ele fazia do poder. Os judeus, outrora tão felizes, vieram também a sentir-lhe os deploráveis efeitos, porque ele os considerava como os únicos capazes de se oporem aos seus desígnios, porque desde a infância aprenderam de seus antepassados, por uma constante tradição e ainda mais por suas santas leis, que existe um só Deus, criador do céu e da terra. Todos os outros povos, embora gemendo sob o peso do domínio tirânico desse cruel príncipe, não deixaram, por adulação, de se submeter ao seu desejo e de aumentar assim a sua presunção e sua vaidade. Vários romanos mesmo não tinham vergonha de desonrar a liberdade romana, introduzindo na Itália uma complacência e uma submissão de bárbaros, pela adoração que lhe prestavam. Mas ele sabia que, ao contrário, os judeus, antes de permitir que se tocassem por pouco que fosse nas suas leis, prefeririam correr para a morte como para a imortalidade, porque do mesmo modo que não se pode tirar uma pedra de um edifício sem que pouco a pouco o resto venha a cair, assim também, que tudo é importante, no que se refere à religião, e não poderia haver empreendimento mais ousado e mais ímpio, do que pretender trocar um homem mortal num deus imortal, pois que é mais fácil que Deus seja mudado em homem do que um homem em Deus; além de que seria abrir a porta a uma horrível infidelidade e a uma espantosa ingratidão para com Deus, Todo-poderoso, cuja bondade infinita espalha continuamente graças e favores sobre todas as criaturas.
Esta foi a causa da cruel guerra feita à nossa nação. Que maior desgraça pode suceder aos servidores, do que terem seu senhor como inimigo? Ora, os súditos dos imperadores são seus servidores e quanto à moderação dos príncipes que tinham precedido Caio tornava sua obediência justa e doce, tanto a sua era insuportável. A clemência era para ele uma virtude desconhecida e ele se gloriava de calcar aos pés todas as leis e de aboli-las como inúteis, para fazer reinar em seu lugar a violência e a tirania. Mas seu furor tinha principalmente por objeto os judeus. Ele não se contentava de tratá-los como servos, mas os tratava como escravos e como os mais vis e mais abjetos de todos os escravos. Assim, podia-se dizer, com verdade, que eles tinham nele em vez de um senhor, um cruel e impiedoso tirano.
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