Capítulo 1 – Antíoco Epifânio, rei da Síria, torna-se senhor de Jerusalém e suprime o serviço de Deus. Matias Macabeu e seus filhos restabelecem-no e vencem os sírios em vários combates. Morte de Judas Macabeu, príncipe dos judeus, e de João, dois dos filhos de Matias, que havia morrido muito tempo antes. *

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* Este registro também se encontra no Livro Décimo Segundo, capítulos 6, 7, 8, 9, 10, 11, 14 e 19, Antigüidades Judaicas, Parte I.

 

No mesmo tempo em que, por um sentimento de glória tão comum entre os grandes príncipes, Antíoco Epifânio e Ptolomeu, sexto rei do Egito, estavam em guerra, para decidir pelas armas a quem pertenceria o reino da Síria, os maiorais dos judeus estavam divididos entre si. O partido de Onias, sumo sacerdote, tendo-se tornado mais forte, expulsou de Jerusalém o filho de Tobias. Eles retiraram-se para junto do rei Antíoco, rogaram-no que entrasse na Judéia e ofereceram-se para servi-lo, com todas as suas forças. Como ele já tinha formado o seu desígnio, não tiveram dificuldade em obter dele o que desejavam. Ele se pôs em campo com um poderoso exército, tomou Jerusalém e matou um grande número dos que eram do partido de Ptolomeu. Permitiu o saque aos seus soldados, despojou o Templo de tantas riquezas de que estava cheio e aboliu durante três anos e meio os sacrifícios que ali se ofereciam todos os dias a Deus. Onias fugiu para junto de Ptolomeu, que lhe permitiu construir perto de Heliópolis uma cidade e um Templo da forma do de Jerusalém, de que poderemos falar a seu tempo.

Antioco não se contentou de se ter tornado, contra sua esperança, se­nhor de Jerusalém, de lá ter tirado tantas riquezas e de ter derramado tanto sangue, mas deixou-se levar de tal modo pelo ressentimento, pela lembrança das amarguras que tinha suportado, naquela guerra, que obrigou os judeus a renunciar à sua religião, a não mais mandar circuncidar seus filhos e a imolar sobre o altar, destinado para os sacrifícios, porcos, em vez de vítimas que nos­sas leis obrigam a oferecer a Deus. O horror que os maiorais e as pessoas de bem não podiam deixar de demonstrar por essa abominação custava-lhes a vida: pois Baccida, que governava por Antioco, todos os lugares da Judéia, sendo naturalmente muito cruel, executava com alegria suas ordens ímpias. Sua insolência e suas violências chegavam a tal excesso que não havia ultraje que ele não fizesse mesmo às pessoas de condição e suas incríveis maldades faziam ver, cada dia, uma nova e espantosa imagem da tomada e da desolação dessa cidade, antes tão poderosa e tão célebre.

Mas por fim, tão insuportável tirania animou os que a toleravam a se libertarem dela e a tomarem vingança. Matias (ou Matatias, Macabeu), sacer­dote que morava na aldeia de Modim, seguido por seus cinco filhos e seus domésticos, matou Baccida e fugiu para as montanhas, a fim de evitar o furor das guarnições mantidas por Antioco. Muitos reuniram-se a ele e então ele desceu aos campos, deu combate aos chefes das tropas desse príncipe, ven­ceu-as e as expulsou da judéia. Estes felizes resultados elevaram-no a tão alto grau de glória que todo o povo, para lhe mostrar seu agradecimento por tê-lo libertado da escravidão, escolheu-o para comandá-lo e ele deixou, ao morrer, Judas Macabeu, o mais velho de seus filhos, como sucessor de sua fama e de sua autoridade.

Como esse generoso filho, de tão generoso pai, não podia duvidar dos esforços que Antioco faria para se vingar das perdas recebidas, reuniu todas as forças da nação e foi o primeiro que fez aliança com os romanos. Antioco não deixou, como ele havia previsto, de entrar com um poderoso exército na Judéia e esse grande general venceu-o numa batalha. Para não perder o fruto e não deixar esfriar-se a coragem de suas tropas, ele foi no ardor da vitória atacar a guarnição de Jerusalém que ainda estava inteira, expulsou-a da cidade alta, que tem o nome de santa e a obrigou a se refugiar na cidade baixa. Assim, tornou-se senhor do Templo, purificou-o, rodeou-o com um muro, mandou fazer vasos novos, para empregá-los no serviço de Deus, colocou-os no Templo no lugar dos que haviam sido profanados, fez construir um outro altar e recomeçou a oferecer a Deus os sacrifícios.

Terminadas estas coisas, Antioco morreu. Antioco Eupator, seu filho, não herdou menos seu ódio contra os judeus do que a coroa; reuniu um exército de cinqüenta mil homens de infantaria e mais ou menos cinco mil de cavalaria e oitenta elefantes, entrou na Judéia do lado das montanhas; tomou a cidade de Betsura. Judas, com o que possuía de suas tropas, veio ao seu encontro, no estreito de Betsacharia; antes que os exércitos se chocassem, Eleazar, um dos seus irmãos, tendo visto um elefante muito maior que os outros, que trazia em seu dorso uma grande torre, toda dourada, pensou que o rei estaria sob a mesma. Adiantou-se por entre os demais, abriu caminho entre os inimigos, chegou até o enorme animal e como não podia alcançar aquele que estava lá em cima e que ele julgava ser o rei, colocou-se por baixo do elefante, feriu com a espada o ventre do animal, que o matou esmagando-o na queda. Assim, uma coragem tão heróica mostrou com este feito de valor a grandeza de alma deste generoso israelita que preferiu a glória à própria vida. Quem montava esse elefante era um cidadão particular, mas quando tivesse sido o mesmo Antioco, a coragem heróica de Eleazar tê-lo-ia levado ao mesmo resultado, pois não podendo esperar sobreviver a tão grande feito, ele teria sempre mostrado até que ponto seu amor pela glória o fazia despre­zar a morte.

Este fato foi um presságio a Judas Macabeu, do que lhe ia acontecer naquele dia. Depois de um mui longo e violento combate, o grande número dos inimigos e sua boa sorte os fez vitoriosos. Vários judeus foram mortos; Judas retirou-se com o restante à toparquia de Gofnítico. Antioco avançou em seguida até Jerusalém, mas foi obrigado a se retirar porque tinha falta de mui­tas coisas necessárias para a subsistência de seu exército. Lá deixou uma guar-nição de soldados, que julgou conveniente e mandou o restante para os quar­téis de inverno na Síria.

Judas, para aproveitar-se da sua ausência, reuniu o que pôde de soldados de sua nação, além dos que haviam ficado deste último combate, e foi lutar contra as tropas de Antioco. Jamais um homem mostrou mais valor do que ele, nesse dia. Perdeu a vida, depois de ter matado um grande número de inimigos e João, seu irmão, tendo caído numa emboscada que lhe armaram, também viveu ape­nas alguns dias a mais.

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